“Segunda-feira dia 07/02, volta às aulas, do nosso ano letivo 2011.”

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Educação Bancária - Primeira Parte

Na década de 1980 iniciei minha carreira como professora da rede pública estadual. A partir de 1986 participei de uma série de estudos sobre a teoria da Emília Ferreiro e Ana Teberosk e participei dos seminários sobre o construtivismo. Em 1993, ao assumir a função de Professora Orientadora da EJA no CIEP 268, comecei a ler livros de Paulo Freire e compreendi os conceitos básicos da Educação Libertária, proposta por ele, em oposição à Educação Bancária. Através de uma analogia que busca as semelhanças das práticas escolares com as práticas bancárias, proponho uma reflexão sobre a educação pública no Brasil de hoje.

Observem algumas semelhanças do Banco (instituição financeira) com a Escola (instituição de ensino):

Primeira semelhança: quem deposita nunca consegue sacar o que depositou, nem no banco e nem na escola.

No banco, depois que o seu dinheiro entra, eles fazem algumas mágicas com ele, uma delas é a chamada PS (prestação de serviços). Elas servem para que uma parte do seu dinheiro passe da sua conta corrente para a conta deles. Não importa se você usa ou não usa o serviço, eles vão cobrar do mesmo jeito porque está no contrato. É assim que você fica cada vez mais pobre, recebendo sempre menos do que depositou. Segundo as estatísticas do DIEESE em 2006/2007 as RPS (receita de prestação de serviço) das tarifas bancárias, aumentaram o lucro dos bancos. “Juntos, os seis maiores bancos brasileiros arrecadaram R$ 21,9 bilhões de seus clientes na prestação de serviços – um crescimento médio de 16,8%.”(Fonte: DIEESE/SEEB-DF)

Na Escola, Depois que o conteúdo entra na cabeça do aluno, o cérebro também faz algumas mágicas chamadas sinapses. "As sinapses ocorrem no "contato" das terminações nervosas (axônios) com os dendritos. O contato físico não existe realmente, pois as estruturas estão próximas, mas há um espaço entre elas (fenda sináptica). Dos axônios são liberadas substâncias (neurotransmissores), que atravessam a fenda e estimulam receptores nos dendritos e assim transmitem o impulso nervoso de um neurónio para o outro."

Trocando em miúdos, toda mensagem nova que apresentamos aos alunos, entram pelos canais sensoriais, (olhos, ouvidos, nariz, boca...) e vão para o cérebro que rapidamente manda aquela novidade seguir em frente até encontrar o seu lugar. Nesta caminhada, a mensagem entra e sai, faz conexões, acha as combinações e quando encontra o seu lugar, fica ali quietinha, a mensagem virou um conhecimento que está pronto para ser usado. Então, o professor avalia se aluno aprendeu, ele aplica uma prova mas, como no banco, o professor nunca consegue sacar com a prova a mesma coisa que depositou. O aluno (com excessão da cola e da decoreba), pode devolver, ampliado, diminuído, interpretado mas nunca devolve igual.

Segunda semelhança: O risco de você perder tempo e dinheiro é muito grande tanto no banco quanto na escola.

Sabem aqueles investimentos de risco ou aqueles de longo prazo nos quais você é obrigado a realizar depósitos mensais e quando precisa do dinheiro só recebe parte dele, porque descontaram tantos impostos e cobraram tantas taxas que ele ficou parecendo uma toalha com enormes buracos e você não entende como foi que aconteceu? Pois bem, quando o cliente leva um prejuízo com alguns desses produtos, o lógico seria não repetir o erro. Mas qualquer “favor” que peça ao gerente, este com muita educação e simpatia acaba convencendo-o a contratar novamente o mesmo serviço, aquele investimento que todos sabem quem é que lucra e quem fica com o prejuízo ou com a toalha esburacada.

Sabem aqueles conteúdos de risco (que a gente ensina mas sabe que o aluno não vai aprender) e aqueles outros que o professor resume tanto que acaba com a essência, com a lógica e com o sentido deles? Aqueles conteúdos que foram tirados da toalha e que a deixaram toda esburacada e que fazem a maior falta na hora das sinapses. Pois bem, o ideal seria que no Ensino Fundamental o aluno nunca aprendesse fórmulas e nunca recebesse conceitos prontos. Ele precisa receber informações, conhecer e trilhar a trajetória das aprendizagens que produziram as fórmulas, os conceitos e deve ser capaz de criá-las. O índice da reprovação escolar ainda é muito alto no Brasil. Quando reprovamos um aluno estamos dizendo para ele com simpatia e educação que o nosso produto é ótimo e que ele deverá nos contratar novamente. O prejuízo e o ônus do frio que passou pelos buracos da toalha são unicamente do aluno. Quem lucra com a repetência? Ninguém. E o prejuízo é de toda a sociedade.


Terceira semelhança: alguns professores parecem banqueiros, adoram quando o seu cliente está no vermelho.

No banco, o cliente está sempre perdendo dinheiro, é um ralo aberto que sangra as finanças do assalariado. Como conseqüência, rapidamente ele fica no vermelho, aí o gerente olha para a conta, dá uma risadinha e o chama para uma conversa(nunca se iluda, gerente de banco precisa bater meta e adora cliente endividado). Na conversa ele ( o gerente) apresenta a solução para o problema da dívida. Adivinhem qual é? Acertou quem disse que todo gerente apresenta sempre a mesma solução: contrair uma dívida maior (empréstimo) para saldar a outra já existente. Os bancos estão endinheirados e querem emprestar dinheiro. Os juros parecem baixos mas dá ao banco 100% de lucro sobre o dinheiro emprestado em três anos. “O crescimento do crédito continua impulsionado pelos empréstimos consignados. Em junho de 2007, o crédito consignado em folha de pagamento somava R$ 57,9 bilhões contra R$ 40,1 bi no mesmo mês de 2006 – um crescimento de 44,6%. Em junho de 2007 o banco ITAÙ realizou 24,5% de operações de empréstimo às grandes empresas e 43,0% às pessoas físicas.”


Alguns professores adoram dar nota vermelha, recentemente soube de uma história absurda mas verídica. Num conselho de promoção um professor diminuiu a nota do aluno para que ele fosse reprovado. Já que o infeliz está com nota vermelha em duas matérias eu diminuo a nota dele para que perca direto e não tenha o direito de fazer a dependência. Para mim soou desta forma, já que ele está sangrando vou dar mais uma "facada para que morra logo" (não se iluda, professores assim conseguem contaminar e influenciar os outros para que aprovem uma decisão como esta). Quando professores com este perfil se reúnem, as soluções apresentadas quase nunca são positivas para a escola e muito menos para os alunos. Quando um grupo busca soluções criativas, autruístas e humanistas para os problemas da educação, certamente se surpreenderão com os resultados. As aprendizagens podem ir além da expectativa dos professores. O aluno aprende mais do que, o que lhe foi ensinado. Isso porque ele (um ser social) tem experiências extra-escolares que os professores raramente conhecem e quase nunca valorizam, falo da bagagem cultural que ele traz das suas relações familiares e com outros grupos. Enfim, suas experiências e aprendizagens influenciam suas respostas mas, só os verdadeiros educadores reconhecem que numa via de mão dupla quem anda na contra mão corre o risco de atropelar ou ser atropelado e que é isso que acontece no processo ensino/aprendizagem.

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©2009 Alexandre Fernandes Por Orkut